Desafios Regulatórios para o Anonimato na Internet no Contexto Nacional

2025
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A possibilidade de criar perfis anônimos – ou seja, sem verificação de identidade – sempre fez parte da realidade digital. Embora possa, de forma otimista, fortalecer a liberdade de expressão, ela também abre espaço para práticas ilícitas e discursos de ódio em espaços pouco fiscalizados, onde a sensação de impunidade derivada do anonimato se intensifica e estimula tais condutas.

Segundo dados do Observatório Nacional dos Direitos Humanos (ObservaDH), entre 2017 e 2022 foram registradas mais de 293 mil denúncias de crimes de ódio na internet. Esses números mostram que, atualmente, o espaço digital se tornou o principal palco da violência discursiva, sendo evidente que a anonimização contribui para esse cenário.

Diante dessa realidade, a regulação do anonimato digital tornou-se um tema central no debate público brasileiro. O Projeto de Lei nº 2.630/2020 (PL das Fake News), ainda em trâmite na Câmara dos Deputados, busca regulamentar as plataformas digitais, exigindo maior transparência e moderação de conteúdos que violem direitos humanos. Paralelamente, desde o início de 2025, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) defende uma regulação mais rigorosa, apoiando o Projeto de Lei nº 4.691/2024, que estabelece parâmetros para o anonimato digital no Brasil e até sua vedação expressa. Segundo o presidente da agência, a ausência de regras claras criou um ambiente de baixa responsabilização jurídica, em descompasso com o art. 5º, IV, da Constituição Federal, que assegura a liberdade de expressão, mas veda o anonimato.

Entretanto, esse entendimento é controverso. Muitos defendem que o art. 5º, inciso IV não deve ser interpretado de forma absoluta, sob o risco de comprometer o próprio direito à liberdade de expressão, que já não tem padrões muito claros. Nesse sentido, o dispositivo deve ser compreendido como um mecanismo de proteção ao direito de resposta e à reparação de danos materiais, morais ou à imagem, e não como uma proibição absoluta da manifestação anônima.

Assim, é cabível admitir que o anonimato expressivo – aquele que não serve de escudo para ilícitos, mas que fortalece a livre manifestação – seja legítimo e compatível com a Constituição.

O Supremo Tribunal Federal (STF) tem reconhecido a necessidade de leitura sistemática do art. 5º, IV. O Ministro Alexandre de Moraes, ao julgar o Agravo Regimental 10.391/DF, afirmou que a liberdade de expressão “é consagrada constitucionalmente e balizada pelo binômio liberdade e responsabilidade, ou seja, o exercício desse direito não pode ser utilizado como verdadeiro escudo protetivo para a prática de atividades ilícitas”, e que “uma vez desvirtuado criminosamente o exercício da liberdade de expressão, a Constituição Federal e a legislação autorizam medidas repressivas civis e penais, tanto de natureza cautelar quanto definitivas.”

Surge, então, a necessidade de criar um marco normativo capaz de conciliar a liberdade de expressão anônima com mecanismos efetivos de responsabilização. O Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014) tentou dar conta do problema, ao impor aos provedores o dever de guardar registros de conexão e de acesso a aplicações de internet e permitir a identificação judicial de usuários em casos de ilicitude, sem suprimir a livre manifestação (arts. 10, § 1º, 13, § 5º e 15 § 1º e § 3º). Ao mesmo tempo, estabeleceu, no art. 19, que os provedores de aplicação de internet só poderiam ser responsabilizados por conteúdo de terceiros se não removessem a postagem após uma ordem judicial.

A medida revelou-se insuficiente para assegurar a efetiva proteção dos direitos fundamentais no ambiente digital. Por essa razão, em junho de 2025, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a parcial inconstitucionalidade do art. 19, determinando que as plataformas respondam civilmente mesmo sem ordem judicial em casos que envolvam conteúdos antidemocráticos, terrorismo, discurso de ódio, entre outros. Na prática, os provedores deverão implementar, de imediato, sistemas de autorregulação obrigatória, canais acessíveis de atendimento e representação jurídica no Brasil com poderes plenos para responder judicial e administrativamente.

Contudo, a atuação estatal ainda é incapaz de alcançar certos espaços, deixando os direitos fundamentais expostos a ataques por meio do anonimato. Isso ocorre, por exemplo, em plataformas hospedadas em jurisdições estrangeiras sem sede no Brasil – às quais a legislação nacional não se aplica – ou em serviços estruturados para dificultar deliberadamente a identificação de seus usuários, como é comum em certos fóruns e comunidades efêmeras.

Essas plataformas costumam apresentar características técnicas que desafiam qualquer controle estatal, como hospedagem em servidores offshore, manutenção de logs inexistentes ou temporários e constante migração de domínios. Essa verdadeira “arquitetura da invisibilidade” gera um anonimato absoluto e uma sensação de impunidade, incentivando a migração de conteúdos ilícitos para ambientes nos quais a atuação jurídica se torna praticamente impossível.

Portanto, o debate sobre o anonimato na internet e a liberdade de expressão está longe de acabar. Mas é certo que, diante da estrutura global da internet, fiscalização e responsabilização não podem depender apenas de normas fixas ou nacionais. O papel do direito regulatório vai além de restringir o anonimato: consiste em modernizar seus instrumentos de governança às novas necessidades digitais.

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